Quando a fé se politiza: Os riscos da igreja-comunista

  • 24/07/2025
Quando a fé se politiza: Os riscos da igreja-comunista
Quando a fé se politiza: Os riscos da igreja-comunista (Foto: Reprodução)

A complexa relação entre fé cristã e ideologias políticas tem sido objeto de debate e interpretação ao longo da história. Em particular, a aproximação entre os ideais comunitários presentes nos primórdios do cristianismo e os princípios do comunismo levanta uma questão intrigante: em que momento uma igreja-comunidade, fundamentada na partilha e no cuidado mútuo, pode ser percebida ou se transformar em uma “igreja-comunista”, carregando as conotações políticas e ideológicas específicas deste termo?

Para analisar essa questão, é crucial distinguir os conceitos de “comunidade” no contexto eclesial e o sistema político-econômico do “comunismo”. A igreja, em sua essência, é chamada a ser uma comunidade de fé, amor e serviço, onde os membros compartilham recursos espirituais e, muitas vezes, materiais, seguindo o exemplo das primeiras comunidades cristãs descritas no livro de Atos dos Apóstolos. Essa partilha, motivada pela fé e pela caridade cristã (ágape), visa atender às necessidades dos membros e fortalecer os laços fraternos.

Por outro lado, o comunismo, como ideologia política e sistema socioeconômico, preconiza a abolição da propriedade privada dos meios de produção, a luta de classes e, em sua forma marxista-leninista, a tomada do poder pelo proletariado e o estabelecimento de uma sociedade sem classes e sem Estado. Embora possa haver uma sobreposição superficial no ideal de uma sociedade mais igualitária e na valorização da coletividade, as motivações, os métodos e os objetivos subjacentes são fundamentalmente distintos.

A transição de uma “igreja-comunidade” para uma “igreja-comunista” ocorre quando a ênfase na partilha e no cuidado mútuo transcende a esfera da fé e da prática cristã e se alinha explicitamente com os princípios ideológicos e políticos do comunismo. Isso pode se manifestar de diversas formas:

- Adoção da linguagem e da análise marxista: A igreja começa a interpretar a realidade social e econômica através das lentes da luta de classes, da exploração capitalista e da necessidade de revolução proletária.

- Priorização da agenda política comunista: A ação da igreja se volta primariamente para a promoção da agenda política do comunismo, em detrimento de sua missão espiritual primordial, como a evangelização, o discipulado e a celebração dos sacramentos.

- Subordinação da fé à ideologia: A doutrina cristã é reinterpretada ou adaptada para se adequar aos princípios do comunismo, muitas vezes negligenciando ou distorcendo ensinamentos centrais da fé.

- Alinhamento com regimes comunistas: A igreja demonstra apoio acrítico a regimes políticos comunistas, ignorando ou justificando suas práticas autoritárias e a perseguição religiosa.

- Perda da autonomia eclesial: A igreja se torna um instrumento do partido comunista ou do Estado, perdendo sua liberdade de expressão e ação.

É importante ressaltar que a crítica social e o engajamento em questões de justiça e desigualdade são inerentes à mensagem cristã. A Bíblia clama pela defesa dos pobres, dos oprimidos e dos marginalizados. No entanto, essa preocupação social, quando genuinamente enraizada nos valores do Evangelho, não implica necessariamente uma adesão ao comunismo. A igreja pode e deve ser uma voz profética na sociedade, buscando a justiça e a transformação social a partir de seus próprios fundamentos teológicos e éticos.

O perigo reside na instrumentalização da fé para fins políticos ideológicos específicos. Quando a comunidade de fé se deixa capturar integralmente pela ideologia comunista, ela corre o risco de perder sua identidade distintiva, sua liberdade de pensamento e sua capacidade de oferecer uma crítica genuína e abrangente às injustiças sociais, que podem existir em diferentes sistemas políticos e econômicos.

Em suma, a linha tênue entre uma igreja que vive os princípios comunitários do Evangelho e uma “igreja-comunista” é cruzada quando a fé é subsumida por uma ideologia política específica, quando a agenda política se sobrepõe à missão espiritual e quando a autonomia eclesial é comprometida. Discernir essa fronteira exige um constante exame crítico das motivações, dos métodos e dos objetivos da comunidade de fé, mantendo sempre a centralidade do Evangelho e a fidelidade à sua missão primordial.

Que Deus nos ajude!

 

Daniel Santos Ramos (@profdanielramos) é professor, possui Licenciatura em Letras Português-Inglês (UNICV, 2024) e bacharelado em Teologia (PUC MINAS, 2013). Pós-graduado em Docência em Letras e Práticas Pedagógicas (FACULESTE, 2023). Mestre em Teologia (FAJE, 2015). Atualmente é colunista do Portal Guia-me, professor de Língua Portuguesa no Ensino de Jovens e Adultos (EJA) e Ensino Médio e de Língua Inglesa no Ensino Fundamental (ll) da SEE-MG, professor de Teologia no IETEB e professor de Português Instrumental do IE São Camilo. Escreveu dois livros, "Curso de Teologia: Vida com Propósito" (AMOB, 2023) e "Novo Curso de Teologia: Vida com Propósito (IETEB, 2025). Além de possuir mais de 20 anos de experiência na ministração da Palavra. É membro da Assembleia de Deus em Belo Horizonte (desde sempre), congrega no Templo Central.

* O conteúdo do texto acima é uma colaboração voluntária, de total responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do Portal Guiame.

Leia o artigo anterior: Além dos muros da fé: O impacto revolucionário do "cristão anônimo" de Karl Rahner

FONTE: http://guiame.com.br/colunistas/daniel-ramos/quando-fe-se-politiza-os-riscos-da-igreja-comunista.html


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